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Reforma tributária e os impactos no setor de infraestrutura

Projetos que utilizam insumos pré-fabricados e menor volume de mão de obra tendem a ser menos onerados

A promulgação da Emenda Constitucional 132/2023 e da Lei Complementar 214/2025 representa uma transformação profunda do sistema tributário brasileiro. Entre as principais mudanças está a substituição dos tributos sobre o consumo (IPI, ICMS, ISS, PIS e Cofins) por três novos: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS).

Embora o último deva ter impacto limitado no setor de infraestrutura, o IBS e a CBS apreentam consequências relevantes de ordem operacional e estratégica.

A reforma modifica substancialmente a carga tributária efetiva ao extinguir tributos com sistemáticas consolidadas e inserir novos, com regimes distintos de incidência, apuração e creditamento. Ao mesmo tempo, elimina benefícios fiscais tradicionais e inaugura um novo arranjo federativo com a criação do Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), o que impõe tanto desafios quanto oportunidades ao setor.

Tributação atual e regimes especiais

No modelo atual, a tributação sobre o consumo no setor de infraestrutura envolve a incidência de IPI, PIS/Cofins, ICMS e ISS sobre insumos e receitas, com a possibilidade de adesão a regimes especiais.

Dentre eles, destacam-se: Reidi (Lei 11.488/2007), que suspende a incidência de PIS/Cofins sobre aquisições de bens e serviços voltados a obras de infraestrutura nos setores de transporte, energia e saneamento; Reporto (Lei 11.033/2004), concedendo suspensão de tributos federais na importação e aquisição de bens destinados à modernização da infraestrutura portuária e ferroviária; RET (Lei 10.931/2004): com regime especial que engloba IRPJ, CSLL, PIS e Cofins, com especial impacto sobre a construção civil residencial; regimes aduaneiros especiais, como admissão temporária e o ex-tarifário, que reduzem a carga tributária na importação de bens de capital; benefícios estaduais de ICMS, concedidos via convênios no âmbito do Confaz, como diferimentos, isenções e créditos presumidos, notadamente importantes para investimentos em infraestrutura (ex.: Convênios ICMS 85/11 e 147/13).

O que muda com a reforma tributária

A transição para o novo modelo tributário vai ocorrer de forma escalonada até 2032. O PIS/Cofins será extinto até o fim de 2026; o IPI permanece apenas para produtos da Zona Franca de Manaus; ICMS e ISS serão substituídos pelo IBS até 2032. Já CBS e IS entram em vigor em 2027, com o IBS em fase de teste a partir de 2026 e aplicação plena prevista para 2029.

A LC 214/2025 regula a transição dos regimes especiais. Estão mantidos o Reidi (art. 106) e o Reporto, prorrogado até 31/12/2028 (art. 105). Também foram preservados os regimes aduaneiros especiais e a desoneração para aquisição de bens de capital (arts. 108 a 111). Por outro lado, os benefícios relacionados ao ICMS serão extintos até 2032, com compensações limitadas no tempo (até 31/12/2032), o que pode gerar questionamentos constitucionais, sobretudo nos casos em que as contrapartidas pactuadas se estendam além desse prazo.

Regimes aduaneiros especiais, como permanência temporária (arts. 88 e 89 – LC 214/2025) passam a incluir também IBS e CBS. Já o RET seguirá vigente apenas para IRPJ e CSLL após a transição. A extinção dos incentivos estaduais de ICMS impõe desafios expressivos, ainda que uma fase de transição com compensações esteja prevista até 31/12/2032.

Impacto econômico do IBS e da CBS

Estudos de Borges (2023) indicam que a tributação indireta sobre o setor de construção civil corresponde atualmente a 4,7% do valor ofertado, chegando a 5,3% no segmento de infraestrutura. Com a reforma, a alíquota nominal combinada de IBS e CBS, está estimada em aproximadamente 28%, porém será beneficiada com a redução 50% para operações de construção civil (art. 252, V. comb. com 261 da LC 214/2025), o que resultaria em uma alíquota de cerca de 14%.

O impacto efetivo, no entanto, dependerá do modelo de contratação, da proporção entre mão de obra (não creditável) e insumos (creditáveis), bem como da margem de lucro. Projetos que utilizam insumos pré-fabricados e menor volume de mão de obra tendem a ser menos onerados, especialmente em comparação com o ISS, que é cumulativo e não permite a geração de créditos.

Ainda assim, haverá disputas sobre o enquadramento de determinados serviços como construção civil com alíquota reduzida. Atividades pré-operacionais ou especializadas podem não ser contempladas automaticamente, exigindo interpretações precisas e possivelmente judicializadas.

Riscos e limitações

A partir da implementação definitiva da reforma, não poderão ser concedidos novos benefícios fiscais com CBS e IBS, salvo as hipóteses expressamente previstas na EC 132/2023 e regulamentadas pela LC 214/2025. Isso impõe restrições aos atuais beneficários de incentivos fiscais concedidos com o ICMS.

A redução desses benefícios entre 2029 e 2032 (art. 384 da LC 214/2025) será compensada pelo Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais, mas apenas até 31/12/2032. Essa limitação temporal pode ser considerada inconstitucional, especialmente em benefícios concedidos mediante contrapartida com cobertura temporal além dessa data. Adicionalmente, a transição pode impactar contratos em curso, sobretudo nos casos de projetos dependentes de incentivos.

Reequilíbrio econômico-financeiro dos contratos em execução

A LC 214/2025 (arts. 373 a 377) regula o reequilíbrio econômico-financeiro de contratos firmados antes de sua vigência, desde que a proposta seja anterior à lei. O reequilíbrio considera: a) efeitos da não cumulatividade nos custos da contratada; b) possibilidade de repasse de encargos tributários; c) impactos das mudanças tributárias na transição (arts. 125 a 133 do ADCT); e d) benefícios de tributos extintos pela EC 132/2023.

A contratada pode solicitar ajustes em 90 dias, com decisão em até 90 dias (prorrogáveis uma vez), permitindo implementação provisória em casos de impacto financeiro relevante (art. 376). O art. 375 determina revisão de ofício pela administração se houver redução tributária, gerando assimetria.

Considerações finais

A reforma tributária terá impactos expressivos ao setor de infraestrutura. A redução de alíquotas para construção civil, o novo regime de creditamento, a manutenção parcial de regimes especiais e a extinção escalonada de benefícios exigirão reestruturações. Mesmo os regimes mantidos estarão sujeitos a nova regulamentação, o que pode demandar adaptações para garantir a eficácia.

A eliminação dos incentivos tradicionais e as incertezas da transição impõem planejamento fiscal e contratual detalhado, especialmente no que se refere à alocação de mão de obra e ao reequilíbrio econômico-financeiro de contratos de longo prazo.

Por outro lado, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), previsto no art. 159-A da Constituição Federal, representa uma oportunidade relevante para financiar projetos de infraestrutura alinhados a critérios de inovação e sustentabilidade, ainda pendente de regulamentação.

Vale, por fim, distinguir as implicações da reforma entre a construção de obras de infraestrutura e a manutenção ou operação, notadamente no caso de concessionárias. São atividades com naturezas distintas e que sofrerão impactos tributários diferenciados. Diante disso, torna-se indispensável o acompanhamento próximo da produção legislativa infraconstitucional e das normas regulamentares que balizarão a implementação desse novo modelo tributário.

BORGES, B. Impactos Macroeconômicos Estimados da Proposta de Reforma Tributária. In: Santi, E. M. D.; Machado, N. (Coords.). Imposto sobre Bens e Serviços. São Paulo: Editora Max Limonad, 2023.

Convênio ICMS 85/11

Convênio ICMS 147/13

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Emenda Constitucional 132, de 20 de dezembro de 2023.

Lei Complementar 214, de 2025.

Lei 11.488, de 15 de junho de 2007.

Lei 10.931, de 2 de agosto de 2004.

Lei 14.133, de 1º de abril de 2021.

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